quarta-feira, 2 de outubro de 2019

Afinal pra que estudar Matemática?

O que escrever num blog que trata sobre educação? Aulas particulares, mais especificamente? Na verdade, criatividade sempre me norteou pelos meus caminhos mesmo nos tempos de Olimpíada de Matemática. Eu utilizava a Matemática como um veículo criativo antes de me descobrir também um ator. lembro que por muitas vezes acordava de uma noite de sono com a solução de um problema que tinha me afligido por dias a fio. E por que voltar a isso aqui? Recentemente, eu encerrrei uma turma de preparação para ingresso no Colégio Militar de São Paulo para alunas de 11 anos em média. Muitos dos meus alunos atuais estão nessa faixa de idade, concomitantemente aos que prestarão vestibular esse ano e concursos.

Todavia, trabalhar com pré-adolescentes nesses tempos de tecnologia, de uma geração que já nasceu com o smartphone na mão, tem me mostrado muitas coisas. Principalmente, uma possibilidade de resposta para a pergunta que não quer calar: Por que aprender Matemática para a vida?

É fato que a Matemática tem sido abordada pelas escolas de uma maneira bem pouco ou quase nada estimulante para esses alunos. A professora ou professor fica preso a um planejamento com poucas folgas que precisa cumprir, enquanto uma enchente de estudantes vão ficando para trás com as operações fundamentais (somar, subtrair, multiplicar, dividir), equações, ângulos, retas e frações. Se somarmos a isso a uma abordagem bastante conteudista se comparada a outros países, vemos alunos treinados a repetir padrões sem entendimento de onde tudo isso está alicerçado.

Considero que esse sintoma vem se agravando e o tempo para uma interação mais próxima com o estudante vem escasseando, o que me leva a usar esta plataforma para dividir essas reflexões. Como ator, no teatro, tenho estado cada vez mais interessado em enxergar o teatro como uma tecnologia que atualiza o ser humano. Todos nós desempenhamos papéis em nossas interações sociais, somos atores sociais sem consciência na maior parte dos casos.

Como diria uma amigo, é como um prédio sem síndico, no qual as identidades múltiplas que temos vão assumindo o comando da nossa máquina-corpo sem nenhum exercício de reflexão.

Sem contar que implantes e manipulações genéticas vêm aumentando o espectro do humano através da ligação cada vez mais íntima entre humanos, máquinas e robôs. Isso gera um questionamento direto acerca dos limites do humano. Como ter um corpo que possa suportar tamanha velocidade e quantidade de informações?O que ou quem faz o filtro de todas essas questões ao alcance de um clique?

Acredito que aí vem a impotância de uma educação que permita que o estudante amplie sua noção do mundo, desenvolva seu senso crítico. É claro que a primeira premissa para um professor é ou deveria ser saber bem o conteúdo. Mas, o que fica numa relação tão próxima com um professor particular durante meses ou anos de convivência? Há algo que extrapola os limites da disciplina formal na intereção entre professor(a) e aluno (a). Sim. Quem ensina deve ser capaz de transmitir o conteúdo, fazer com que o conhecimento aflore no estudante. Despertar o seu prazer de ver seus horizontes se expandirem. Isso sem deixar que os conteúdos da sala de aula sejam trabalhados.

Uma amizade vai sendo desenvolvida nessa relação. Quem deve ensinar tem uma responsabilidade enorme por tratar com pessoas que muitas vezes estão fragilizadas por todo um contexto que varia mas passa pelos pontos abordados aqui.

Assim, muitas vezes nas entrelinhas, ora diretamente, o professor precisa mostrar que há um caminho possível que só se desenrola quando o estudante começa a caminhar. Muitas vezes, mais do que ensinar a matéria, primeiramente precisamos ensinar os alunos a estudar. Porque cada um estuda de uma maneira diferente, mas é fundamental ver o que funciona para aquela pessoa que está diante de você para aprender.

Superado esse desafio (quando ele é superado porque exige dedicação por parte do aluno), dúvidas vão aparecer e podem comprometer a caminhada do estudante. É fundamental que o professor mostre que, ao elaborar as próprias dúvidas, o aluno começa a ter uma participação mais ativa e com consciência nesse processo pois sai do piloto automático. Questiona. Não recebe a informação passivamente. Só assim acredito ser possível que aquele ser humano se desenvolva nas suas potencialidades múltiplas e se prepare para os desafios presentes e futuros. E, obviamente, quem ensina não passa incólume por todo esse processo. Ao desempenhar o papel de professor, aprendo sempre sobre mim, sobre as pessoas e sobre o mundo. E foi esse pensamento que me fez vir até aqui hoje e escrever.

Frisando que a maior parte das pessoas não têm dificuldades tão alarmantes com Matemática e sim, traumas de aprendizagem, pra mim, aprende-se Matemática para lidar com o mundo e a forma com que esse processo se dá é decisivo no sucesso dessa empreitada. Para podermos ter um material nosso e fazer uso de tantas informações e tão velozes de forma crítica e saudável para tentarmos fazer do mundo um lugar sempre melhor.